sábado, 3 de janeiro de 2009

Um dia...




Desconhecido




Um dia vou acordar. Em silêncio. Um dia vou-me levantar, abrir a janela. Um dia vou abrir a janela, fumar um cigarro.
Um dia vou saír de casa. Como em qualquer outro dia o fiz. Um dia vou saír de casa.
Um dia, como em qualquer outro dia, vou fazer todas as coisas. Todas as que fiz em qualquer outro dia.
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Um dia, o tempo vai passar. Lentamente, muito lentamente, o tempo vai passar.
Um dia, vou sentar-me numa mesa, pedir um café. Um dia vou beber um café, fumar um cigarro. Lentamente, muito lentamente, o tempo vai passar.
Um dia vou sentir-me cansado. Como em qualquer outro dia senti. O tempo a passar, lentamente. A passar.
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Um dia, a noite vai chegar. Como em qualquer outro dia chegou. Um dia, a noite vai chegar.
Um dia, talvez já uma noite, vou entrar em casa. Como em em qualquer outro dia, talvez já noite, entrarei.
Um dia, talvez já noite, vais perguntar. Pelo silêncio. Silêncio...
Um dia, talvez já noite, vais perguntar. Em silêncio, o silêncio.
O tempo, passando lentamente, vai-se esgotar. O tempo, lentamente, já se tinha esgotado no tempo.
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Um dia, talvez já noite, vou saír de casa. Vou entrar no carro, sem parar.
Um dia, talvez já noite, vou chegar. A qualquer lado. Vou chegar. O tempo, parado.
Uma noite, o dia vai surgir. Como em qualquer outra noite o fez. Uma noite, talvez já dia, vou fumar um cigarro. Fumar um cigarro, vêr.
Um dia, não vou voltar. Um dia, depois de uma noite depois de um dia, o tempo vai recomeçar.
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Um dia espero não vêr esse dia. Um dia espero vêr esse dia...


quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

A ilusão da mentira...

Ivan Efimov




Já menti. Com amôr, por amôr. Por ódio, por compreensão, por simpatia. Para não ter que dar justificações. Por incertezas. Por tantas razões... Já menti.

A mentira é boa.
Permite fugir do que não se quer enfrentar, lidar com situações complicadas. Sêr simpático. Permite defesas. Adiar o inadiável. Tanta coisa...
A mentira é boa.

Há várias formas de mentir. Com um olhar. Com palavras doces. Com sorrisos. Com abraços. Com sexo. Até há aquela célebre mentira do "não-minto-se-não-me-perguntarem-nada". Gosto particularmente desta. É daquelas que até nos faz sentir íntegros. Porque não se mente se não se contar uma mentira. Certo ?...

É normal. O que seria de nós sem a mentira ? Completamente expostos ao mundo e à vida. A vida seria muito mais complicada sem ela. E quem é que quer complicar a vida mais do que o que ela já é ?
E porque é que educamos os nossos filhos a não mentir ? Dizemos que a mentira é feia. Que não se deve mentir. Que Jesus castiga. Mas se nós mentimos! Com maiôr ou menôr consciência. Mas mentimos!
É verdade que há mentiras que nos custam, que nos pesam. Mas isso resolve-se cá, bem dentro. É comodo. Até porque evita tantas chatices...

Por vêzes até mentimos a nós próprios. E muitas mais vêzes do que aquilo que temos consciência. Ao ponto de dizermos "Mas eu não minto". O problema é que estas são perigosas para nós. Por vêzes magoam-nos. Problema nosso. Não é com a intenção de querer prejudicar ninguém. Só queremos sêr felizes. E o que há de maiôr e mais bonito do que isso ? É justificável. Certo ?...

Claro que com a mentira, vem a verdade. Mas porque é que se insiste tanto na verdade ? Nem é por maldade que se mente. Por isso... Para quê, a verdade ? É incómoda. Assola-nos o espírito. Destroi-nos as nossa ilusões. A verdade é má.
Sim, a mentira é boa. É própria do sêr humano. É uma questão de defesa, de sobrevivência. Justifica-se sempre porque "toda-a-gente-mente". Certo ?...


Sim, a mentira é boa. Até ao dia em que nos mentem. Aí, não é na mentira que se pensa. A noite surge, o corpo repousa na cama mas o sono teima em não vir. No conforto da almofada, descobre-se algo que se perdeu na alma. Uma coisa pequena, quase um pormenor. Tão pequeno que, ao mentir, quase nos esquecemos dele. Dá pelo nome de confiança.


A mentira é boa. Certo ?...




"As costas dos outros são o espelho da nossa alma"